Assim é Novo Museu da Acrópole, que abre em Atenas no sábado 20 de junho. Ele tem 25.000 metros quadrados, custou US$ 175 milhões, levou sete anos para ser construído e carrega, no interior de suas paredes de vidro (que asseguram iluminação natural o ano todo), um manifesto político em dois tempos.
O primeiro tempo é agora: o museu serve para que o governo grego exija, pela enésima vez, a devolução de parte dos frisos do Parthenon (conhecidos como Mármores de Elgin) que foram saqueados pelos britânicos e estão expostos no Museu Britânico desde 1816. Eles foram levados por Lord Elgin, então embaixador do Reino Unido junto ao império otomano. Os frisos contêm baixos-relevos com 192 cenas da vida ateniense, número equivalente aos heróis da famosa Batalha de Maratona, na qual os gregos bateram os persas em 490 a.C. Vários países já devolveram aos gregos suas relíquias do Parthenon. A Grã-Bretanha resiste.
O segundo tempo a que o museu alude é histórico: remete ao apogeu da civilização grega, matriz do que chamamos de civilização ocidental, que ocorreu por volta do século V antes de Cristo. O projeto do arquiteto suíço Bernard Tschumi é uma homenagem aos construtores do Parthenon, que começou a ser erguido depois da expulsão dos persas, em 480 a.C. A construção do templo foi entregue a Phidias, um grande escultor ateniense, e aos arquitetos Ivtinus e Callicrafes. O resultado é único em beleza e arrojo. Suas colunas se inclinam imperceptivelmente em relação ao centro do edifício (como se fossem tocar-se no infinito), em uma sutileza de cálculo e realização que ainda espanta a engenharia moderna. Mas sua importância não é apenas arquitetônica. O Parthenon foi erguido nos 30 anos em que Péricles foi o primeiro-cidadão de Atenas, e sua construção ocupou boa parte da mão de obra livre da cidade, contrariando o modelo de trabalho escravo que pôs de pé a totalidade dos monumentos da Antiguidade. Trata- -se de um edifício único e de um período histórico único, do qual nos chegaram não só a poesia de Homero, a filosofia de Aristóteles e a matemática de Pitágoras, como a própria concepção de democracia.
Os visitantes que cruzarem a ponte de vidro que leva ao museu estarão caminhando em direção a uma das obras mais complicadas da arquitetura recente. Desde o começo dos anos 1970 se sabia que o Museu da Acrópole, construído no século XIX, havia se tornado obsoleto. Mas faltava dinheiro para erguer um novo edifício à altura do acervo e da ambição dos gregos. Houve concursos arquitetônicos para o projeto do novo museu em 1976, 1979 e 1989, sem que se chegasse a conclusão alguma. Finalmente, fez-se uma competição sob os auspícios da União Europeia em 2000, na qual Tschumi venceu. “Ninguém consegue ser dórico como os antigos gregos”, disse o arquiteto. “Em vez disso, tentei expressar a mesma precisão, a mesma claridade do templo original.” Parecia o fim da confusão, mas não. Com o projeto em andamento, descobriu-se que havia ruínas de valor incalculável sob o terreno que deveria receber o museu. Isso forçou os construtores a girar, reposicionar e replanejar a obra e suas fundações, incluindo o piso de vidro e os pilares que mantêm o museu no ar, como palafita.
Quem estiver em Atenas neste ano pagará apenas 1 euro para conhecer o novo museu. Por comparação, cobram-se 9 euros no Louvre, de Paris. Por causa da crise global, o governo grego cortou a verba de festividade de inauguração do prédio, mas manteve as entradas baratas. É mais uma forma de mostrar aos britânicos que Atenas pode exibir os frisos do Parthenon para as grandes massas, como acontece em Londres. Dias atrás as autoridades britânicas responderam que poderiam “emprestar” os famosos mármores, desde que os gregos firmassem um documento no qual reconheceriam a propriedade britânica das peças. A proposta foi orgulhosamente recusada.
Ivan Martins
Revista Época, nº 579. 22/6/2009
http://revistaepoca.globo.com
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