domingo, 30 de março de 2008

A pressa é inimiga da percepção

Será que podemos desacelerar num mundo viciado em velocidade? Uma antiga fábula francesa conta que um menino chamado Pedro não gostava da escola e torcia para que as aulas acabassem logo. Ele nunca conseguia curtir aquilo que estava fazendo e sempre ansiava pela próxima coisa. No inverno, desejava que fosse verão. No verão, queria a acolhedora lareira do inverno. Mas do que mais gostava era brincar com a amiga Liese, com quem queria se casar um dia.

Certa vez, caminhando pela floresta, viu uma anciã emergir das árvores segurando uma bola prateada da qual pendia um fio dourado. “O que é isso?”, ele perguntou. “Isto é o fio da sua vida”, respondeu ela. “Se você quiser que o tempo passe mais depressa, é só puxar um pouquinho o fio, e uma hora passará como se fosse um segundo. Mas quero alertá-lo: uma vez que o fio tenha sido puxado, ele não pode ser enfiado de volta.” Pedro pegou a bola alegremente. Que presente mais perfeito!

No dia seguinte, enquanto Pedro divagava sobre seu fio mágico, a professora lhe deu uma bronca por não estar prestando atenção. “Queria que já fosse hora de voltar para casa”, pensou Pedro, quando sentiu a bola prateada no bolso. Cuidadosamente ele puxou um pouquinho do fio. De repente, a sineta tocou e a aula acabou. Pedro correu feliz para casa. Como seria fácil a vida dali por diante! Assim ele começou a puxar o fio um pouquinho por dia. Mas numa noite Pedro pensou que, se desse uma puxada um pouco maior, a escola acabaria de uma vez e logo poderia se casar com Liese. Então deu uma puxada maior e, de manhã, acordou para se dar conta de que era um carpinteiro. Quando o dia do pagamento parecia muito distante, Pedro dava uma puxadinha no fio e logo tinha dinheiro no bolso.

Certo dia, Pedro perguntou a Liese quando se casariam. “Daqui a um ano estarei pronta”, disse ela. Naquela noite, não conseguindo dormir, ele puxou o fio dourado debaixo do travesseiro. Pela manhã percebeu que um ano havia passado e ele poderia casar com Liese. Agora se sentia verdadeiramente feliz.

Depois que seu primeiro filho nasceu, Pedro sentiu que não precisava de mais nada na vida. Mas, sempre que a criança adoecia ou chorava, ele dava uma puxadinha no fio. Aí veio uma fase em que os negócios ficaram ruins. Felizmente, Pedro tinha a bola mágica, e podia puxar o fio sempre que quisesse. Mas um dia ele viu, surpreso, que o fio dourado havia se tornado prateado. Olhou para o espelho e notou que seus cabelos estavam grisalhos e o rosto enrugado. Subitamente sentiu medo, e decidiu puxar o fio com mais cuidado.

Com a bola mágica, Pedro poderia acelerar o tempo. Mas para quê?

Liese deu à luz mais crianças e a casa ficou lotada. Pedro pensou ansiosamente como seria mais fácil se seus filhos já fossem crescidos. Deu um grande puxão no fio, e no dia seguinte seus filhos já haviam saído de casa. Ele e Liese estavam sós. Seu cabelo estava totalmente branco e suas costas doíam. Com desalento, viu que o fio mágico se tornara cinza e sem brilho. Decidiu, então, dar uma caminhada na floresta.

De súbito, uma voz surgiu das árvores, “E aí Pedro, você teve uma boa vida?”. Era aquela anciã! “Por causa da sua bola mágica, nunca tive de sofrer ou esperar por nada na vida”, respondeu Pedro. “Mesmo assim, tudo passou tão rápido! Seu presente não me deu boa fortuna.” “Então peça algo”, disse ela. Pedro murmurou: “Eu gostaria de viver minha vida novamente, mas sem a bola mágica. Quero poder experimentar tanto as coisas boas como as ruins, para que a minha vida não seja tão sem significado como um devaneio”. Ele devolveu a bola prateada e, exausto, fechou os olhos.

Quando acordou estava na sua própria cama. Sua mãe o sacudia, dizendo: “Você vai chegar atrasado à aula”. E, quando Pedro caminhou até a escola com Liese, reparou que era uma linda manhã e em quanto se sentia feliz por estar vivo.

Susan Andrews, psicóloga e monja iogue.
Autora do livro Stress a Seu Favor, ela coordena a ecovila Parque Ecológico Visão Futuro.
www.visaofuturo.org.br
susan@edglobo.com.br

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