domingo, 30 de dezembro de 2007

A cura da alma e a busca da felicidade

"Uma viagem de pai e filho a Machu Picchu é o ponto de partida para um encontro com o amor, a coragem e, talvez, a fé".

Há oito anos, minha vida parecia estar sendo sugada por um buraco negro. Num exame de rotina, quando investigava uma dorzinha em outro lugar, descobri um pólipo na bexiga. Era um tumor maligno, por sorte flagrado em estágio inicial. À cirurgia seguiu-se o pesadelo físico e mental de enfrentar a morte de frente. Aliado à dor, havia o inferno psicológico: a paranóia, a solidão e a sensação de que eu jogara a vida fora. Estava convencido de que era culpado pela minha própria doença, resultado de alguma somatização por meus erros acumulados. Havia somente uma esperança: melhorar a mim mesmo, ganhar a paz e, com ela, recuperar minha saúde.
A experiência do câncer é das mais duras pelas quais se pode passar. Vi como eu era fraco e dependente dos outros. Vi como não há lugar na vida para a arrogância. Descobri a importância da fé. Atravessei um processo profundo de autoconhecimento. Passei a buscar a felicidade sem perder tempo. Sobretudo, me aproximei das outras pessoas. Talvez pelo mito da auto-suficiência que construímos, nós, homens, muitas vezes temos mais dificuldade em lidar com a dor e a sensação de impotência diante de uma doença capaz de levar à morte. Entramos em parafuso. Procurei transformar a saída do câncer também em uma maneira de ganhar a maior das coragens, que é encarar o medo, aceitar os fatos da vida com dignidade e preparar-me para quando chegar a próxima vez de encarar o fim, ainda que venha a ser realmente a última.

Como a maioria dos escritores, que aproveitam a experiência pessoal como combustível de sua literatura ou são compelidos a fazê-lo de modo a lidar melhor com seus sentimentos, transferi essa travessia para minha quarta obra de ficção, um romance que acaba de chegar às livrarias (Campo de Estrelas, da Editora Globo). No livro, a luta contra o câncer se mistura a lembranças do passado, uma antiga viagem do protagonista com seu pai a Machu Picchu, relato de aventuras por um país estranho, que o aproximara pela primeira vez dos mistérios da vida. Um personagem do passado, misto de príncipe inca, anjo, mendigo e vigilante, se transforma no elemento que pode trazer as respostas para as angústias do presente – a cura, ao menos, da alma.

Na minha luta pessoal, encontrei vários anjos como esse. Alguns deles foram pessoas que haviam tido doenças graves e saído sem seqüelas. Enquanto elas achavam que iam morrer, centenas de milhares de outras pessoas, então saudáveis, tinham morrido, vítimas de outras doenças ou de causas repentinas. Se me dissessem naquela época como estaria minha vida oito anos depois, eu teria dificuldade em acreditar. Hoje, tenho uma mulher que adoro, Graziela, um enteadinho de 11 anos, João Gabriel, e um filho de 11 meses, André Rayan, capazes de iluminar o mundo com um sorriso. Sei muito mais sobre mim, algo essencial para fazer melhores escolhas. Estou mais forte em todos os sentidos. Há seis anos estou curado, e em março fui liberado pelos médicos dos meus exames anuais da bexiga. Vivo em paz e estou feliz.

Procurei fazer de Campo de Estrelas não um livro de auto-ajuda, mas um romance em que as pessoas podem encontrar amparo contra o medo. O exemplo humano é o maior conforto, e não há nada como o romance para mostrar a vida da maneira mais forte e genuína. Por trás dos seus trechos mais ficcionais estão as emoções mais verdadeiras. Campo de Estrelas não oferece respostas exatas, mas mostra um caminho para que as pessoas encontrem sua própria saída da tormenta. É também a minha forma de retribuir às pessoas, agradecido, todo o carinho e apoio que delas recebi.

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