Nascido no Rio de Janeiro em 15 de dezembro de 1907 e diplomado em meados da década de 1930 pela Escola Nacional de Belas Artes, Oscar Niemeyer aprende com os ensinamentos de Rodrigo de Melo Franco Andrade e Lúcio Costa o devido cuidado à história e ao patrimônio edificado; do convívio com o franco-suíço Le Corbusier, epicentro do pensamento moderno, Oscar, como gosta de ser chamado, incorpora consistência funcional no que cria e aplica comedimento na composição dos projetos a que se dedica e desde suas incursões iniciais, insere propostas de leitura própria. Fatos que embasam sua obra e o levam a se tornar o partícipe principal da implantação da arquitetura moderna no Brasil.
Niemeyer se inquieta com o viés cartesiano da arquitetura racional e já em suas primeiras intervenções demonstra que estabeleceria caminho próprio, surpreende a arquitetura internacional a partir de inovações no complexo da Pampulha da década de 1940, o que vem a se tornar característica na notória produção de sua extensa obra. Oscar apresenta originalidade inesperada em seus projetos, que embasados por concepção estrutural apurada, de instigantes espacialidades e escala, geram formas delineadas pela sensualidade do desenho, e faz com que suas obras, referenciadas por conexões do imaginário coletivo, seja advindas do barroco mineiro, das montanhas ou das formas femininas, de releituras da antiguidade ou de si próprio, ou mesmo de inclinações surreais, se firmem como símbolo e assumam o potencial de ícone urbano.
A cúpula com arcos reversos da Catedral, a colunata do Palácio do Alvorada, as meias esferas equilibradas pelas torres do Congresso Nacional nos remetem a Brasília; o Edifício Copan e a Marquise do Ibirapuera a São Paulo; o MAC a Niterói; o Museu Oscar Niemeyer a Curitiba. São imagens de obras que referenciam o lugar onde se instalam, obras que assumem o status de "marco urbano", elementos urbanos carregados de conteúdo simbólico que, como quer Kevin Lynch, são peças essenciais à orientação urbana e à imagem e identidade da cidade.
Oscar Niemeyer é autor de vasta obra, que vai do design de mobiliário à escultura, e com a síntese da linha orgânica de seu desenho culmina na arquitetura, da casa mínima à grande obra que se estende aos complexos urbanos. Através de seu talento e intelectualidade, Niemeyer implanta cultura aos espaços em que intervém, suas obras atingem refinada depuração e postam identidade de "genius loci" no contexto em que se implantam.
É conhecida a afirmativa de que Niemeyer não considera finalizada a obra enquanto não a explica pela lógica intelectual. Com isso nos ensina que suas obras vêm de uma atenção aprofundada da complexidade da arquitetura, consciente do espaço em que se instala, da estrutura que a estabiliza, da espacialidade de seu uso e da competência de sua estética.
Com a simplicidade de um sábio, Niemeyer traz em sua vivência centenária a lucidez de um jovem e cuidado com a vida na persistência altruísta em chamar atenção às mazelas sociais.
Oscar trabalha diariamente em seu atelier, iluminado pelas janelas da Baía de Guanabara e as montanhas do Rio de Janeiro, que unidas à admiração pelas formas do corpo feminino e monitoradas pelo seu talento suprem de graça e leveza as criações do gênio. Atento aos acontecimentos e conhecimentos gerais, Oscar ainda se permite ao estudo da filosofia e transita de questões existenciais ao universo da cosmologia.
Para se entender a importância do arquiteto Oscar Niemeyer deve-se atentar à coerência de seu percurso, que se instala com uma linha evolutiva constante acompanhada de provocações formais que instalam estranheza e paixão e não poupam os sentidos de quem as vivencia. Sua obra apresenta oportunidade pela identidade que conquista, pelo potencial formal e a interlocução espacial que assume perante o observador.
Oscar não deixa escola fácil de ser seguida. Uma obra para se referenciar na sua há que ser entendida num contexto de prospecção maior do que ela própria. Sua lógica criativa é composta da atenção ao conhecimento e história humana, à técnica construtiva e percepção espacial, ao contraponto entre forma e vazio, do edifico e de seu entorno, com apuração do sentido estético, acompanhada de intuição e magia, lançados pela perspicácia de seu talento. Atenção à matéria que remete ao entendimento da complexidade tectônica e às potencialidades aedificatórias, magia edilícia que se destina ao bem-estar da vida na cidade.
João Virmond Suplicy Neto é arquiteto, professor da PUC-PR e presidente do Departamento do Paraná do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB)
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