Daqui a uma semana o companheiro Barack Obama estará na Presidência dos Estados Unidos. Sua chegada será uma festa. No mínimo ela significa a partida de George Bush. Noves fora isso, pela primeira vez na vida, ele precisará mostrar a que veio. Terá que abrir a quitanda todas as manhãs com mercadoria para vender e troco para dar à freguesia.
A posse do companheiro será a primeira grande celebração do século. Ele prestará o juramento constitucional com a mão sobre a Bíblia de Abraham Lincoln e fará um discurso memorável, mas a quitanda continuará lá: Casa Branca, Pennsylvania Avenue, 1.600.
Por maiores que sejam as expectativas (digamos torcida), Obama surfou os últimos meses sem colocar uma só ideia no pano verde.
Compreensivelmente, especula-se o início de seu governo olhando-se para o retrovisor. A crise econômica chama o exemplo de Franklin Roosevelt e algumas atitudes de Obama, como a nomeação da rival Hillary Clinton para a Secretaria de Estado, alimentam paralelos com Abraham Lincoln. A primeira semelhança embute o desejo de que a liderança de Obama tire os Estados Unidos da crise. Infelizmente, ela se baseia num entendimento rudimentar das virtudes de Roosevelt. A associação com Lincoln, estimulada por seus marqueteiros, é um benevolente disparate.
Roosevelt assumiu a Presidência em 1932 com a economia americana em estado de dissolução. A recessão estava no terceiro ano, a taxa de desemprego encostara nos 20% (10 milhões de trabalhadores), cinco mil bancos haviam quebrado e os demais tinham fechado as portas ou limitado os saques. Quando ele morreu, em 1945, a Depressão era coisa do passado e os Estados Unidos detinham metade da riqueza do mundo.
Quem reativou a economia americana não foi o new deal (grafado em letras minúsculas antes de se tornar um plano de governo), mas a Segunda Guerra Mundial, que levou o país ao pleno emprego. O legado do New Deal não foi a reorganização da economia, mas algo muito maior: a reorganização da sociedade, com a criação de um capitalismo capaz de trazer a patuléia para dentro do sistema.
As propostas de incentivo econômico oferecidas por Barack Obama podem levar a uma recuperação, mas para que o paralelo com Roosevelt feche o círculo fica faltando a guerra. Em benefício do companheiro, ele se assemelhou a Roosevelt quando rebarbou a reunião do G-20 de Bush dizendo que "os Estados Unidos têm um presidente de cada vez".
O paralelo com Lincoln é uma extravagância. Obama, como ele, fez política no Illinois e chegou à Casa Branca com a simples experiência de senador. E só. A crise de Obama é econômica. A de Lincoln era política. Ele assumiu com sete estados rebelados, achando que acomodava a encrenca. Foi o maior presidente da História americana porque decidiu preservar a União. Tentou conter a secessão do Sul com generais de parada e só achou o caminho de casa quando chamou dois matadores: Ulysses Grant, a quem Mary Lincoln, sua mulher, chamava de "açougueiro", e William Sherman, que explicava: "A guerra é o inferno."
A partir de quarta-feira, Obama terá de abrir a quitanda e, antes de ser Roosevelt, terá de batalhar para não ser Herbert Hoover. Em 1928, quando ele assumiu, era o homem mais respeitado dos Estados Unidos.
Na crise, denunciou a "orgia de louca especulação", mas foi destruído por ela.
A posse do companheiro será a primeira grande celebração do século. Ele prestará o juramento constitucional com a mão sobre a Bíblia de Abraham Lincoln e fará um discurso memorável, mas a quitanda continuará lá: Casa Branca, Pennsylvania Avenue, 1.600.
Por maiores que sejam as expectativas (digamos torcida), Obama surfou os últimos meses sem colocar uma só ideia no pano verde.
Compreensivelmente, especula-se o início de seu governo olhando-se para o retrovisor. A crise econômica chama o exemplo de Franklin Roosevelt e algumas atitudes de Obama, como a nomeação da rival Hillary Clinton para a Secretaria de Estado, alimentam paralelos com Abraham Lincoln. A primeira semelhança embute o desejo de que a liderança de Obama tire os Estados Unidos da crise. Infelizmente, ela se baseia num entendimento rudimentar das virtudes de Roosevelt. A associação com Lincoln, estimulada por seus marqueteiros, é um benevolente disparate.
Roosevelt assumiu a Presidência em 1932 com a economia americana em estado de dissolução. A recessão estava no terceiro ano, a taxa de desemprego encostara nos 20% (10 milhões de trabalhadores), cinco mil bancos haviam quebrado e os demais tinham fechado as portas ou limitado os saques. Quando ele morreu, em 1945, a Depressão era coisa do passado e os Estados Unidos detinham metade da riqueza do mundo.
Quem reativou a economia americana não foi o new deal (grafado em letras minúsculas antes de se tornar um plano de governo), mas a Segunda Guerra Mundial, que levou o país ao pleno emprego. O legado do New Deal não foi a reorganização da economia, mas algo muito maior: a reorganização da sociedade, com a criação de um capitalismo capaz de trazer a patuléia para dentro do sistema.
As propostas de incentivo econômico oferecidas por Barack Obama podem levar a uma recuperação, mas para que o paralelo com Roosevelt feche o círculo fica faltando a guerra. Em benefício do companheiro, ele se assemelhou a Roosevelt quando rebarbou a reunião do G-20 de Bush dizendo que "os Estados Unidos têm um presidente de cada vez".
O paralelo com Lincoln é uma extravagância. Obama, como ele, fez política no Illinois e chegou à Casa Branca com a simples experiência de senador. E só. A crise de Obama é econômica. A de Lincoln era política. Ele assumiu com sete estados rebelados, achando que acomodava a encrenca. Foi o maior presidente da História americana porque decidiu preservar a União. Tentou conter a secessão do Sul com generais de parada e só achou o caminho de casa quando chamou dois matadores: Ulysses Grant, a quem Mary Lincoln, sua mulher, chamava de "açougueiro", e William Sherman, que explicava: "A guerra é o inferno."
A partir de quarta-feira, Obama terá de abrir a quitanda e, antes de ser Roosevelt, terá de batalhar para não ser Herbert Hoover. Em 1928, quando ele assumiu, era o homem mais respeitado dos Estados Unidos.
Na crise, denunciou a "orgia de louca especulação", mas foi destruído por ela.
Elio Gaspari, jornalista
www.oglobo.com.br
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