Segundo o dicionário, uma exposição é a "exibição pública de obras de arte, produtos, serviços, etc.". Apesar da explicação ampla, o lexicógrafo dificilmente teria imaginado que no "etc." do seu verbete seriam incluídos cadáveres. Pois é o que encontrarão os visitantes do Museu Histórico Nacional que virem a mostra "Corpo humano - Real e fascinante", em cartaz de hoje até 1º de fevereiro de 2009. As obras em exibição são os sistemas ósseo, muscular, sangüíneo, respiratório e tudo o mais que constitui as pessoas.
- Nossa exposição é uma celebração da vida. Sei que isso pode soar estranho, por ela conter corpos mortos. Mas, ao longo dos séculos, os cadáveres têm sido estudados e usados para trazer melhorias aos vivos. É o mesmo que fazemos. Nossa mostra é uma experiência educativa, apresentada de uma forma atraente. Se botássemos os corpos deitados sobre mesas, como numa dissecação médica, ninguém iria vê-los, pois não seria cativante - argumenta o médico Roy Glover, diretor técnico da exposição.
Fumantes jogam fora maços de cigarro em contêiner
Seria essa, então, uma exposição artística? A pergunta é feita com freqüência a Glover, que não se cansa de respondê-la com veemência:
- Não há meta artística em nosso trabalho, mas, se você me perguntar se as pessoas vêem beleza nos corpos, a resposta é sim. Não posso negar. Contudo, o objetivo da exposição não é salientar essa beleza, e sim o valor educativo de se conhecer o corpo humano.
A justificativa serve como medida profilática contra acusações de sensacionalismo. A idéia pioneira de levar cadáveres com seus tecidos, órgãos e músculos à vista para museus foi do anatomista alemão Gunther von Hagens, que criou a exposição "Körperwelten" ("Mundos corporais") em 1995. Desde então, apesar de já ter atraído 25 milhões de espectadores, ela tem sido alvo de ataques. Nela, há cadáveres jogando futebol e tocando guitarra, por exemplo. De acordo com Glover, a filosofia por trás de "Corpo humano - Real e fascinante" é diferente:
- Ele (Hagens) assina as dissecações, como obras de arte. Nós não fazemos isso. Ele mostra seus corpos em filmes, coisa que eu tampouco admitiria. Os corpos, em nossa mostra, estão dispostos respeitosamente. Nossa intenção é expor o funcionamento do organismo humano e as conseqüências de abusos cometidos pelas pessoas. Os espectadores adquirem consciência dos efeitos causados pela falta de exercício, pelo fumo ou por uma dieta que não reponha o cálcio dos ossos. Muitas pessoas, depois de verem um pulmão enegrecido pelo fumo, jogam fora seus maços de cigarro num contêiner que colocamos no fim do percurso. A quantidade é tão grande que costumamos esvaziar o contêiner várias vezes por dia.
Haverá monitores para abordar os visitantes e dar explicações. Eles são recrutados nas cidades aonde chega a exposição e recebem treinamento do próprio Glover. O requisito é que tenham conhecimentos médicos prévios.
A empresa que contratou Glover - que é professor de anatomia aposentado da Universidade de Michigan, onde lecionou por 35 anos - chama-se Premier Exhibitions e é especializada em exposições com apelo recreativo.
- A primeira exposição que essa empresa fez foi a do Titanic. Ela teve permissão exclusiva para mergulhar, trazer objetos do navio e os expor - conta Glover.
Uma questão intrigante no caso de "Corpo humano - Real e fascinante" é a origem do material exposto. Os 16 corpos e 225 órgãos em exibição são de chineses, o que já gerou especulação e desconfiança. No programa, lê-se que todos os indivíduos tiveram morte natural e haviam optado por participar de um programa de doação de seus próprios corpos em benefício da ciência, realizado pela República Popular da China. Glover complementa:
- Jamais usaríamos corpos obtidos sem ética. Eu examino cada corpo que recebo. Jamais encontrei um sinal de agressão. O que muita gente não sabe é que os chineses são os melhores dissecadores do mundo.
A exposição se divide em sete salas, baseadas nos sistemas esqueletal, muscular, nervoso, circulatório, respiratório, digestivo e urinário. Ela termina com uma sala dedicada a embriões e fetos e outra que mostra o impacto de doenças e o uso de próteses. Atualmente, há 13 versões da mostra pelo mundo. Em São Paulo, em 2007, foi vista por 450 mil pessoas. A censura é livre. Os ingressos custam R$ 40 ou R$ 20 (meia-entrada).
Eduardo Fradkin
O Globo
"Corpo Humano: Real e Fascinante", de 27 de setembro até 1º de fevereiro de 2009.
Museu Histórico Nacional: Praça Marechal Âncora, s/nº, Centro - Rio de Janeiro
De terça à domingo de 9:00h - 18:00h. Entrada até 17:15
Para maiores informações:
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